Pesquisar este blog

domingo, 18 de dezembro de 2011

A outra lição de Guardiola

Não foi apenas dentro de campo com o verdadeiro chocolate que aplicou no Santos que o Barcelona deu uma aula de futebol aos brasileiros. Fora dele, o técnico Pep Guardiola fez o favor de lembrar ao futebol pentacampeão do mundo que, como diria Caetano Veloso, alguma coisa está fora da ordem mundial. Muito fora da ordem.
Desde a vitória do Internacional em 2006 sobre um Barcelona que nem se parece com este atual (embora fosse também brilhante), que o futebol sul-americano não conquista um Mundial de Clubes. São cinco vitórias consecutivas com Milan, Manchester United, Barcelona, Inter de Milão e agora o Barcelona de novo. E uma vergonha histórica do mesmo Internacional derrotado pelo Mazembe, do Congo, na semifinal do ano passado.
Após a acachapante vitória, uma frase de Guardiola me chamou a atenção. Disse o treinador do Barça:
- Meu time toca a bola rápido como o Brasil fez em toda a sua vida, segundo meus pais me contaram.
Pois é. Não é a primeira vez que Guardiola mostra ser fã do chamado "verdadeiro futebol brasileiro". Com 40 anos, tinha 11 quando viu no quintal da sua casa a seleção de Telê Santana encantar o mundo, mas por uma tragédia do Sarriá não levar a Copa. Azar da Copa. Declarado fã do futebol praticado aqui, já citou em entrevistas o Santos de Pelé. Ele aplica no seu time uma filosofia de jogo que o Barcelona cultiva há mais de 40 anos. O carrossel, o futebol total, a marcação em cima e por pressão vem daquela Holanda que também não foi campeã do mundo, mas revolucionou o futebol na Copa de 74. O toque de bola é, como diz o próprio técnico, o brasileiro.
Enquanto os nacionalistas de plantão bradam o verde e o amarelo ufanisticamente, a bandeira daqui segue desbotando a dois anos e meio da Copa do Mundo. Hoje a Espanha é a campeã do mundo e europeia e líder do confuso ranking da Fifa e a Alemanha tem o time que talvez seja um dos poucos que possa fazer frente ao Barcelona. O time catalão é disparado o melhor do mundo mesmo tendo um rival quase tão brilhante logo ali na vizinha Madri. A Holanda que derrotou o Brasil no Mundial veio aqui passear, arrancou um 0 a 0 e poderia ter vencido. Hoje ganharia de novo da seleção. E tenho dúvidas se hoje o Brasil ganharia do aguerrido Uruguai, melhor seleção sul-americana do Mundial e campeão da Copa América.
O Brasil? O Brasil como seleção não joga bola desde 2005, quando deu um espetáculo na Copa das Confederações atropelando Argentina e Alemanha. Desde então o futebol brasileiro murchou e fez vergonha em duas Copas do Mundo. Não são revelados mais grandes jogadores. A geração de Ronaldinho e Adriano não aconteceu na seleção, a de Robinho e Diego não vingou. A esperança agora está no grupo de Neymar e Lucas (Ainda é possível contar com Ganso?), muito jovens que não podem ainda assumir a responsabilidade de salvadores da pátria de chuteiras.
Mas é do jovem jogador do Santos que vem a segunda lição que o Brasil e seus ufanistas aprenderam no dia. Durante o ano de 2011, tentou se fazer aqui um suposto duelo entre Messi e Neymar que sempre me pareceu um tanto quanto ridículo. A indicação do jovem craque santista entre os 23 melhores jogadores do mundo só inflou ainda mais um debate vazio. Como naquela propaganda que o operário dizia “Dê-me um título, dê-me um título”, parte da crônica nacional via em Neymar o seu “miss universo” diante da ausência de glórias recentes. O chamavam de gênio, fenômeno e ousavam compará-lo a Messi, o craque argentino consagrado de inúmeros títulos na carreira (e cinco anos mais velho) e que não se cansa de decidir jogos para o Barcelona. Coube ao próprio Neymar tentar colocar um freio nessa história ao declarar que para ele Messi ainda é o melhor jogador do planeta.
Mas ainda assim muita gente não aceitou. Diziam que com apenas 19 anos Neymar já era um craque e merecia figurar entre os melhores. Houve quem falasse até em injustiça quando da sua não inclusão entre os três finalistas do prêmio da Bola de Ouro, que ficará entre Messi, Xavi e Cristiano Ronaldo. Não houve injustiça. Neymar não jogou mais do que os três finalistas da Fifa e nem do que Iniesta. O que não significa que ele seja um perna de pau. Sua temporada foi fantástica, mas ainda não é a hora dele.
Sim, meus amigos, Neymar joga muita bola e tem um futuro promissor. Mas ele ainda não é o que muitos dizem ser. E ainda bem que tem consciência disso e humildade suficiente para entender que está no caminho certo, mas não chegou ainda no seu destino final. Ele vai conquistar o mundo no tempo certo.
Hoje aprendemos a jogar futebol. Eles têm jogadores fantásticos e aprendemos uma lição que levaremos para o Brasil – disse o jovem craque após o jogo, mostrando estar cada vez mais maduro.
A lição que o Brasil precisa aprender é que o rei está nu. O país ficou para trás no futebol que hoje é comandado por outras praças. A emoção do Campeonato Brasileiro, certamente o mais disputado do planeta, não pode deixar oblíquos os olhos para a qualidade do jogo. O Corinthians foi campeão sem encantar. Os times classificados para a Libertadores também viveram alternando momentos de brilho com outros de futebol sofrível. O melhor time da América do Sul hoje é a Universidad de Chile e a LDUeliminaria qualquer equipe brasileira num mata-mata.
O Brasil precisa aprender que é necessário olhar com mais carinho para a base e começar a formar jogadores de futebol. Veja bem, eu disse jogadores de futebol e não atletas que correm atrás da bola, fazem muitas faltas e não sabem dar um passe. Afinal, como dizia o sábio Didi, quem tem que correr é a bola. Uma lição que o Barcelona aplica muito bem. A título de comparação: O Barça hoje foi campeão com 11 jogadores das canteras dos 14 que entraram em campo. O Corinthians foi campeão brasileiro com um jogador da base em seu time titular.
É preciso parar de viver de improviso. Colocar volante mais habilidoso de meia e meia mais habilidoso como atacante nos times é o reconhecimento que faltam jogadores de talento para as posições. É preciso ser criativo, tirar os antolhos e enxergar o mundo com mais amplitude e entender que hoje existem times e jogadores melhores do que os brasileiros. E começar a trabalhar para virar o jogo. A outra opção é continuar balançando a bandeira velha dos clichês enquanto os outros desfrutam o champagne da vitória.
(Post originalmente publicado no blog Planeta que Rola)

Nenhum comentário:

Postar um comentário