Neste domingo Barcelona e Real Madrid entram no Camp Nou para escrever mais uma capítulo de uma das maiores rivalidades do futebol mundial. Mais do que um clássico, o embate entre os dois maiores clubes da Espanha é um duelo que extrapola os gramados com a rivalidade entre a Catalunha e Castela, região onde fica Madri e a sede do governo espanhol.
Desde o início dessa disputa há 107 anos, os clubes são vistos como representantes das duas regiões cuja rivalidade só aumentou durante a ditadura de Francisco Franco (1939-1975), quando todas as culturas regionais foram reprimidas, incluíndo as línguas diferentes do espanhol como o catalão. A língua catalã acabou se tornando um símbolo para aqueles que desejavam a liberdade e o apoio ao Barcelona era a maneira um pouco mais segura de expressar a dissidência naquela época de repressão. Já o Real Madrid sempre foi visto como o clube ligado ao poder e a personificação da soberania opressora do regime de Franco, embora membros do clube como Josep Sanchez também tenham sofrido nas mãos de partidários de Franco.
Mas é inegável que o Barcelona sofreu muito mais durante a ditadura franquista. Esportivamente, durante os 36 anos da ditadura franquista, a equipe conquistou, por exemplo, apenas oito campeonatos e nenhuma Copa dos Campeões enquanto o Real Madrid faturou 14 taças e mais seis Copas dos Campeões da Europa. Isso sem contar os cinco títulos espanhóis do Atlético de Madrid, o outro clube grande da capital.
O Barcelona é um patrimônio catalão. Quem visita o clube vê logo na porta apenas as bandeiras do Barça e da Catalunha. Lá dentro, o catalão é a língua número 1, inclusive nas mensagens publicitárias em torno do estádio. O espanhol aparece apenas como segunda língua em igualdade de condições como o inglês, língua na qual, aliás, eu fui orientado quando fiz o altamente recomendável tour do Camp Nou. Não é à toa que o lema do Barça é "Mais que um clube" (ou Més que un club, em catalão).
Dentro do campo, a rivalidade entre os clubes cresceu ainda mais na década de 50, quando eles disputaram a contratação do argentino Alfredo Di Stéfano, que acabou se tornando um dos maiores jogadores da história do clube merengue, conquistando os já citados troféus da Copa dos Campeões.
Embora o Barcelona só tenha conquistado seu primeiro título europeu em 1992, os rivais tiveram um duelo importante em 1961 pela principal competição do continente. Então pentacampeão do torneio, o Real foi eliminado pelo Barcelona após uma derrota por 2 a 1. O Barça avançou até a final quando foi derrotado pelo Benfica por 3 a 2. Em 2002, os clubes voltaram a se enfrentar pela semifinal da Liga dos Campeões. Chamado pela imprensa na época de "Jogo do Século", o Real acabou levando a melhor com uma vitória no Camp Nou por 2 a 0 e um empate em 1 a 1 em casa. Na decisão, Zidane marcou um golaço inesquecível, o Real venceu o Bayer Leverkusen por 2 a 1 e foi campeão.
A luta por Di Stéfano foi só o primeiro capítulo de uma história de disputa por craques que se estende até hoje, quando de um lado estarão Kaká e Cristiano Ronaldo, jogando seu primeiro clássico, e do outro Ibrahimovic, também debutando na partida, e Messi, atacante que tem tudo para conquistar o prêmio de melhor do mundo da Fifa. Prêmio, aliás, faturado nas duas últimas temporadas pelo português e pelo brasileiro da equipe merengue.
Vários craques jogaram dos dois lados. Alguns viraram ídolos de ambas as torcidas como o brasileiro Evaristo de Macedo e o dinamarquês Michael Laudrup. Outros foram impiedosamente vaiados, como o português Luís Figo quando jogou pela primeira vez contra o Barça no Camp Nou. E alguns brilharam intensamente com uma camisa, embora não tivessem decepcionado com a outra. É o que aconteceu com Luís Enrique e Ronaldo, ídolos do Barça, mas que não tiveram passagens ruins pelo Real.
Neste domingo, todo o peso dessa história centenária estará no Cam Nou certamente lotado. Mais do que a liderança do Campeonato Espanhol - hoje com o Real com 28 pontos, um a mais do que o Barça - a partida é verdadeiramente um campeonato a parte. E claro que o Real está com sede de vingança depois de na última temporada ser humilhado por 6 a 2 no Santiago Bernabéu. Espero que o espetáculo seja a altura do daquele que para mim é o maior clássico entre clubes do mundo. E que vença o melhor.
Prováveis formações:
Barcelona: Valdés, Daniel Alves, Puyol, Piqué e Abidal; Xavi, Busquets, Keita e Iniesta; Messi e Ibrahimovic. Técnico: Josep Guardiola.
Real Madrid: Casillas, Sérgio Ramos, Pepe, Albiol e Arbeloa; Lassana Diarra, Xabi Alonso, Kaká e Cristiano Ronaldo; Benzema e Higuaín. Técnico: Manuel Pellegrini.
(Post originalmente publicado no blog Planeta que Rola)