José Mourinho voltou para o Chelsea em 2013 em um movimento arriscado, mas ao mesmo tempo corajoso. Se voltasse a ser campeão, seria ainda mais idolatrado pelos torcedores da equipe. Se fracassasse, poderia ter a sua idolatria com a torcida arranhada num clube que ele ajudou a tornar grande novamente. De certa forma, e por ter uma história de sucesso em sua primeira passagem pelo clube (2004-2007), Mourinho poderia ver o clube inglês como uma espécie de paraíso após viver momentos conturbados no Real Madrid, quando brigou com estrelas e líderes da equipe e rachou o vestiário merengue. Só que Roman Abramovich, o dono do clube, foi obrigado a expulsar Mourinho do seu paraíso particular. E tudo começou quando o português brigou com Eva.
Toda a crise do Chelsea começou quando Mourinho afastou a médica Eva Carneiro em agosto, logo após o empate em 2 a 2 com o Swansea City. O time inglês estava disputando apenas a primeira rodada da Premier League e o português criticou publicamente a doutora porque, nos minutos finais da partida, ela correu para prestar assistência a Hazard, que se queixava de dores. Isso deixou a equipe com um jogador a menos em campo. Na ocasião, Mourinho lamentou que "algumas pessoas do staff médico não percebam o jogo" e disse que Eva tinha sido "impulsiva e ingênua". O técnico entendia que o belga tinha apenas algumas queixas e não precisava deixar o gramado.
Muito querida pelos jogadores, Eva acabou se demitindo do clube em setembro, quando o clima para Mourinho no vestiário já estava começando a azedar. Naquela época, a campanha do Chelsea no Campeonato Inglês já inspirava cuidados. Em sete jogos, eram três vitórias, um empate e três derrotas. O time já tinha o mesmo número de derrotas do que em toda o campeonato anterior, quando foi campeão com sobras (oito pontos de vantagem sobre o Manchester City).
O caso Eva fez Mourinho se desgastar ainda mais. Foi criticado pela Associação dos Médicos de Futebol da Inglaterra (FMA, na sigla em inglês), que o acusou de discriminar a doutora, mas Mourinho nunca perdeu a pose. Aliás, se tem alguma coisa que o técnico tem de sobra é auto estima.
Embora o Chelsea colecionasse fracassos com derrotas para Crystal Palace, Southampton, Liverpool e Bournemouth em casa, o treinador sempre tirava da cartola uma frase de efeito. Dizia que estava vivendo uma situação inédita na carreira, pois não sabia o que era perder. E, quando começaram os rumores de que ele poderia ser demitido disse que se isso acontecesse, o Chelsea estaria demitindo o maior técnico da história do clube.
Bom, Mourinho foi demitido (apesar de oficialmente o clube ter anunciado que foi um acordo entre as duas partes) com o título de maior técnico da história dado pelo próprio Chelsea.
"Seus três títulos ingleses, Copa da Inglaterra, Community Shield e três Copas da Liga Inglesa o tornaram o técnico mais vencedor nos nossos 110 anos de história. Mas tanto José quanto o clube concordam que os resultados não vinham sendo suficientemente bons nesta temporada e acreditamos que era do interesse de ambas as partes tomarmos caminhos diferentes", disse um trecho da nota do clube que anunciava a saída do treinador.
Aos poucos, o relacionamento de Mourinho com o vestiário foi se deteriorando num movimento muito parecido com o que ele viveu no Real Madrid. No clube espanhol, chegou a acusar alguns jogadores de vazarem notícias para a imprensa, causando um tremendo mal estar. Na Inglaterra, as queixas eram de uma falta de comprometimento dos seus jogadores.
Após a derrota de segunda-feira para o Leicester City, o surpreendente líder da Premier League, Mourinho foi direto ao acusar os jogadores de estarem fazendo corpo mole.
- Sinto que meu trabalho foi traído. Trabalhei quatro dias nesse jogo contra o Leicester e preparei tudo sobre o adversário. Identifiquei quatro jogadas em que eles marcam quase todos seus gols. Meus jogadores receberam todas informações e, ainda assim, levaram dois gols nessas jogadas - criticou o treinador na ocasião.
Com essa declaração, Mourinho jogou para o público algo que muitos desconfiavam, mas não tinham como comprovar sem uma declaração explícita que viesse de algum jogador. Afinal, o Chelsea exibia problemas defensivos nunca vistos em um time de Mourinho. No mês passado, porém, o "Daily Mirror" publicou a declaração de um jogador, cuja identidade não foi revelada, que teria dito que era "melhor perder com Mourinho do que ganhar com ele". Foi mais um indício dos problemas vividos pelo treinador.
Nos últimos meses, o treinador teve problemas de relacionamento com Hazard, Diego Costa, Fàbregas, John Terry e Matic. Todos jogadores quem nem de longe exibem o futebol que exibiram na temporada passada.
Hoje o Chelsea exibe uma campanha digna do time que foi rebaixado na temporada 1978-79. Naquele ano, o clube foi o lanterna. Hoje, o clube é o 16º colocado com 15 pontos, um acima do Norwich, primeiro time na zona de rebaixamento. Pelo menos o time está classificado para as oitavas de final da Liga dos Campeões da Europa, quando enfrentará o PSG. Mas o grande desafio do futuro treinador será recuperar o time que exibe uma campanha pífia na temporada. São nove vitórias, cinco empates e 11 derrotas em 25 partidas. Hoje, o Chelsea briga contra o rebaixamento na Inglaterra. Além dos títulos e de uma paixão e uma confiança inabaláveis da torcida, que cantou o seu nome em Stamford Bridge mesmo nos piores momentos do Chelsea nesta temporada, esse também é um legado que Mourinho deixou para o clube.
(Post originalmente publicado no blog Planeta que Rola)
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