Pesquisar este blog

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Diferentes formas de ver o futebol feminino

Um time feminino num dos campos da Norway Cup: São 420 no torneio - Marcelo Alves
Campeã mundial em 1995, europeia em 1987 e 1993, e com um campeonato nacional que existe desde 1987, não é difícil entender após uma caminhada por alguns dos 62 campos da Norway Cup porque a Noruega é uma das potências no esporte. São centenas de meninas de todas as idades disputando o torneio. Desde o início, a competição sempre procurou incluir as garotas na disputa. Na primeira edição, em 1972, foram nove times femininos e o Amazone, da Noruega, acabou sendo campeão. Neste ano, são 420 times, o que corresponde a 31% dos 1349 inscritos no torneio.
E a cada ano novos times de outros países trazem equipes femininas. Neste ano, três países estrearam na competição: Afeganistão, Kosovo e Brasil.
É um desejo do torneio incentivar o futebol feminino e ampliar a participação das garotas. Tanto que há três anos, Uganda quase foi impedida de participar da competição porque um dirigente do país africano disse que o futebol não era esporte de mulheres. A resposta foi direta: Ou arrumam um time feminino, ou ninguém vem para Oslo. Hoje Uganda é representada pelo Bring Children time criado em 2005 por um orfanato de mesmo nome que tira crianças das ruas da capital Kampala e as dá oportunidade de educação e prática esportiva.
A equipe do orfanato de Uganda - Marcelo Alves
- Lá elas jogam, fazem amizades, obtém conhecimento e assim não ficam pensando sobre os pais mortos ou desaparecidos. O trabalho é para que elas sigam em frente – conta a técnica do time, Tracy Jones.
Trabalho semelhante é encontrado no time brasileiro da Alunorte Rainforest. As meninas do time sub-20, que foram eliminadas nas oitavas de final, vivem em comunidades carentes em áreas de risco de Barcarena, no interior do Pará. Através do projeto social, elas estudam, têm acompanhamento psicológico e praticam o esporte. Pela primeira vez na Norway Cup, as garotas vivem uma experiência definida como indescritível.
- Para mim está sendo uma experiência inesquecível vir para uma cidade com uma cultura tão diferente – afirma Suele, de 20 anos, que também trabalha como voluntária do projeto.
Suele terminou o segundo grau e sonha em cursar Educação Física. O futebol, ela diz, é diversão e o projeto uma espécie de segunda casa. O futebol também representa muito para Marilene, de 17 anos. Antes de viajar para a Norway Cup, ela viveu dois dramas: a perda da irmã Mariane, que morreu em novembro, aos 19 anos, vítima de uma infecção generalizada, e ela mesma teve uma infecção urinária, que, no entanto, foi tratada a tempo.
Visivelmente emocionada ao lembrar da irmã, Marilene, chamada de Perry no time, diz que só está no Rainforest graças à irmã. Hoje ela vive com os pais e mais cinco irmãos numa casa pequena em Barcarena e diz que ter sido selecionada para o time (todo ano há uma disputada seleção para a formação da equipe) foi a realização de um sonho.
Marilene e Suele, duas jovens do time feminino do Alunorte Rainforest - Marcelo Alves
- Para você ver como Deus tem coisa melhor para nos reservar na frente. Qualquer um de nós poderia ter desistido depois de passar pelas dificuldades que passei, mas eu nunca perdi a vontade. Nunca desisti – disse Perry, que foi reprovada em três seleções antes de entrar para o time.
O time do Rainforest ainda poderá ganhar no ano que vem um adversário brasileiro. Idealizador do projeto social do Karanba no Rio de Janeiro, o norueguês Tommy Nielsen vai começar um time feminino a partir de outubro ou novembro.
- É uma nova etapa do Karanba. Teremos meninas a partir de dez anos – diz.
Convidada para ser treinadora do Rainforest na Norway Cup, a meia da seleção brasileira Formiga diz que o Brasil deveria olhar com mais carinho para o futebol feminino. Para a jogadora, ainda falta apoio dos dirigentes brasileiros para que a modalidade se desenvolva no país. O discurso pode até parecer repetitivo, mas a realidade, ela diz, não mudou muitos nos últimos anos, apesar do relativo sucesso da seleção, que acumula um vice-campeonato mundial e olímpico, mas na Copa deste ano foi eliminada nas quartas de final pelos Estados Unidos.
- O preconceito não existe mais na população, mas ainda há entre os dirigentes. E não sei se o título mundial ia ajudar muito a mudar a imagem. Falta vontade política. Por que não tem um calendário para o futebol feminino? A Noruega não participou da Olimpíada, mas manteve o time. O Japão (que foi campeão mundial) fez amistoso com todos os principais adversários. Nós nos reunimos 15 dias antes para treinar na Granja e fizemos poucos amistosos e sem adversários de peso. Enquanto isso, os Estados Unidos fizeram 15 amistosos – critica Formiga, sem clube desde dezembro do ano passado. – Esse é o incentivo que o esporte dá.
Para Formiga, enquanto o Brasil não se organizar, o futebol feminino será um esporte disputado de forma quase heroica no país. Da mesma forma que acontece no Afeganistão, onde as meninas arriscam a vida pelo esporte. (Conheça a história do Cabul no post abaixo).
Enquanto isso, a Noruega segue tratando igualmente e deixando suas meninas jogarem no mesmo gramado dos meninos.
* O repórter viajou a convite da Embaixada da Noruega
(Post originalmente publicado no blog Planeta que Rola)

Nenhum comentário:

Postar um comentário